Travessia Baependi x Aiuruoca: quatro dias de serras, perrengues e risadas no coração da Serra da Mantiqueira
- Pé no Chão Diretoria de Comunicações
- 2 de mai.
- 9 min de leitura
Subir montanha é muito mais que vencer altitudes — é reencontrar o corpo, escutar o grupo, rir dos perrengues e se perder no céu estrelado. A Travessia Baependi x Aiuruoca, no Parque Estadual da Serra do Papagaio (MG), na Serra da Mantiqueira é uma daquelas experiências que marcam. Foram quatro dias intensos, com acampamento selvagem, chuva, cerração, banho de cachoeira, bolhas nos pés e até onça no acampamento. Mas, acima de tudo, foi encontro: com a natureza e com a gente mesmo. Vem com a gente nesse relato recheado de causos, apelidos, tropeços e conquistas!
Por: Wesley Rabelo (guia) | Editado por: Jessica Maia | 2025
Travessia do Pé no Chão com participação do grupo de amigos Andejos Trekking
A Travessia Baependi x Aiuruoca é uma trilha de trekking no Parque Estadual da Serra do Papagaio, em Minas Gerais, que dura de 3 a 4 dias e percorre cerca de 40 km. É considerada uma trilha de dificuldade média a difícil, com pernoite em acampamento selvagem.
O percurso da travessia atravessa dois municípios mineiros: tem início em Baependi e termina em Aiuruoca, ambos localizados no Sul de Minas Gerais. A trilha está inserida na Serra da Mantiqueira, dentro da bacia hidrográfica do Rio Grande. Durante praticamente todo o trajeto, margeamos o Rio Piracicaba e seus afluentes — o Ribeirão do Charco, o Córrego Forquilha, o Córrego dos Pinhos e o Córrego da Mata. A maior parte do percurso está inserido em áreas protegidas, abrangendo a Área de Preservação Ambiental (APA) da Serra da Mantiqueira e o Parque Estadual da Serra do Papagaio.

Elaborado por: Jessica Maia
A Caminhada possui elevações típicas da Mantiqueira entre 1.100 mil metros de altitude a 2.300 metros, grandes desníveis com subidas e descidas fortes. A vegetação também é tradicional com travessias de florestas nativas de altitude e presença Araucárias, de Candeias centenárias, com grandes bromélias e belas orquídeas da Mata Atlântica. Boa parte da caminhada é realizada em terreno pedregoso, com presenças de Granito Guinaise ao longo dos trechos e inúmeros matacões, com picos de grandes afloramentos rochosos e caminhos sinuosos. Nos meses mais frios, entre maio a agosto é frequente as baixas temperaturas devido a altitude e os fortes ventos do local.
A travessia Baependi x Aiuruoca termina em grande estilo: no cume do famoso Pico do Papagaio, com seus 2.100 metros de altitude. É lá que a gente respira fundo e entende o porquê de tudo. Depois de tanta subida, chuva, acampamento e riso solto, chegar naquele pico é tipo um abraço da montanha. A vista? Quando a cerração deixa, é de arrepiar. Mas mesmo só com neblina, a sensação é de missão cumprida. É como se a serra dissesse: “Parabéns, você chegou”.

Na quinta-feira, 17/04/25, às 22:00h, partimos de BH/Terminal JK com destino ao Parque Estadual do Papagaio. Nesta comitiva estavam presentes os seguintes montanhistas: Alisson Santos / Renata Santos / Wesley Rabelo / Luciane Rabelo / Alessandro Silva / Michaela Silva / Jeferson Amaral / Clotilde Andrade / Simone Medina / Fernando Moreira / Igor Prata / Antônio Carneiro / Hugo Ferreira / Roberta Arruda / Amanda Souza / Elizabeth Oliveira / Izaque Silva.

Ficha Técnica da Travessia Baependi x Aiuruoca
Percurso Total: aproximadamente 40 km
Duração Média: 3 a 4 dias
Grau de Dificuldade: médio a difícil
Altitude Máxima: Pico da Bandeira (2.300 m) e Pico do Papagaio (2.100 m)
Ponto de Início: Comunidade da Vargem Grande (Baependi/MG)
Ponto Final: Aiuruoca/MG
Parque: Parque Estadual da Serra do Papagaio
Dados técnicos



Difícil 2.300 m 40 km


Primeiro dia – 18/04/25
Chegamos à comunidade Vargem Grande na sexta-feira, 18/04/25, às 06:00h — localizada a 25 km de Baependi — para nosso último café da manhã antes de subir para as montanhas. Logo à nossa frente, o famoso Pico do Careta, com seus 1940m de altitude.
Às 07:35h começamos a subida rumo ao Pico do Careta. E, literalmente, foi só subida até o pico. Saímos da cota de altitude de 1170m para 1940m num percurso de 5,5 km. Encontramos com vários grupos de caminhada que também estavam nesta empreitada. Como de costume, assinamos o livro de presença no Pico do Careta após o ataque sem as mochilas cargueiras. Esta empreitada levou em torno de 1h30.

De volta à base do Careta, seguimos em direção ao Camping do Salvador, nosso primeiro camping selvagem. Chegamos por volta das 15:00h, totalizando 12,5 km de percurso. Esse horário ainda nos permitiu escolher um espaço — super disputado, diga-se — já que o camping estava lotado.
Na primeira noite fizemos várias interações com grupos, principalmente vindos de São Paulo. Alguns dos nossos montanhistas já estavam chorando de dores e cansaço... rsrsrs... “Bem-vindos às Serras!” Marcamos de começar a trilha pela manhã seguinte por volta das 07:00h.

Segundo dia – 19/04/25
Às 07:35h saímos do Camping Salvador em direção a uma das cachoeiras mais famosas da região: a Cachoeira do Juju. Não foi fácil romper com a tropa — alguns ainda moídos do dia anterior, lentidão para desmontar as barracas, enfim...
Detalhe: nossa amiga Amanda perdeu a panela de fazer rango.
E bora caminhar. Já margeando o rio que forma a Juju, o cenário de várias corredeiras rapidinho espantou o cansaço. Foi sequência de fotos e mais fotos — e drone também (valeu Igor Ipatinga!).
No topo da Cachoeira do Juju, paramos para aquele banho. Pausa de 1h e mais interação com outros montanhistas.

Neste momento, entendi que a integrante Renata Santos disse que iria ao “banheiro selvagem”, mas, na verdade, ela tinha perguntado se era a direção que seguiríamos após o banho. Quando vimos, ela quase voltou pra Vargem Grande... rsrsrs.
Banho tomado, bora subir serra... e que serra! Literalmente subindo para o céu. Agora o foco era chegar na Cachoeira dos Charcos. Devido à presença de chuva e cerração, não foi possível ver o Pico das Agulhas Negras.
Parada pra lanche e... cadê o Hugo? Pelo rádio ele já havia avisado que estava no Charco! Resolvemos pegar uma “picadinha” e, quando chegamos, descobrimos que havia duas Cachoeiras do Charco. Quase perdemos o Hugo... rsrsrs.
Na travessia do Rio do Charco, fizemos uma corrente humana para passar todas as mochilas — e claro, os integrantes.
Lá na travessia do rio, o Sr. Izaque, vulgo Mathias, deu um mergulho no Charco e, quando voltou à superfície, sentiu falta dos óculos de grau de R$900,00. O rio levou embora. Tentamos procurar, mas não achamos... Mathias...
Permanecemos uns 40 min apreciando a cachu do Charco e, logo em seguida, decidimos atacar terreno para aproveitar a luz do dia. Fomos surpreendidos mais uma vez pela chuva e tocamos até a passagem do riacho pós-Charco. Ao subir a serrinha, resolvemos acampar — isso já batia umas 15:00h.
Devido à falta de espaço, dividimos o grupo em dois, com cerca de 30 m de distância entre eles. E não parava de chegar paulista! Esses danados foram acampando e, quando vimos, parecia uma vila de barracas.

Neste camping não tinha água, então enchemos nossas garrafas alguns metros antes. As garrafinhas estavam valendo ouro... rsrsrs. Detalhe: sem banho nesta parada! Salvo os lenços umedecidos. A noite caiu, muita cerração e muita conversa. Todos apagados, aguardando o dia seguinte. Andamos 9 km nesse dia.
Terceiro dia – 20/04/25
Às 04:00h os paulistas começaram uma falação em tom alto. Parecia tutorial de acampamento de primeira viagem. Até pedimos pra manter o silêncio, mas não teve jeito. Sempre gritando “Pop Corn”... Depois entendemos o raio do “Pop Corn”. E pra variar, nunca saíam antes das 07:00h, só não entendíamos por que acordavam tão cedo... Nesta partida, o foco agora era chegar ao Retiro dos Pedros. Saímos às 07:30h e bora pros Pedros. Andando uns 15 min de serra, pegamos sinal de celular. Em caso de necessidade, vai a dica!
Passamos pelo rio na entrada da RPPN Matutu, paramos para um lanchezinho rápido e logo já estávamos na Pedra Filosofal do Saint Daime. Fotos à parte, já tínhamos placas de animais felinos de médio porte!

Começamos a subida por entre selva e, ao chegar no cume, o Fernando — que já havia chegado bem antes — pediu uma foto em grupo. Detalhe: tínhamos acabado de chegar... Pedi educadamente pra esperarmos voltar o fôlego e ele entendeu... rsrsrs. Após a foto e outro lanche rápido, encontramos um casal com dificuldade de caminhar. Prestamos apoio e eles colaram com a gente até os Pedros.
Ao sair deste ponto e entrar numa matinha, a Srta. Renata e a Luciane foram atacadas por marimbondos. Houve uma crise de pânico e correria. Elas tomaram um anti-inflamatório e, com cautela, seguimos viagem. Chegamos aos Pedros por volta das 14:30h.
O Sr. Igor e o Hugo, juntamente com outros montanhistas, fizeram um ataque ao Pico do Bandeira, logo em frente ao Retiro dos Pedros.
Enquanto isso, na base, montávamos o camping, dando altas risadas. Chegamos com uma chuvinha que só veio pra baixar a temperatura da noite.
Um grupo que estava a alguns metros de nós, com guia local, flagrou uma onça rodeando o acampamento. Soltaram uma bombinha pra espantá-la.
O céu estava fantástico. Nesse momento, a panela da Amanda brotou na mochila de outro montanhista. Acreditamos que ela deu o tomé pro colega do outro grupo carregar a panela... rsrs.

Houve permuta de cachaça e rango entre os grupos. O Sr. Hugo passou por uma barganha: forneceu uma branquinha em troca de um rango das paulistas... rsrsrs.
Nesta noite, a professora Clotilde deu uma aula de astronomia. Com seu auxiliar Mathias (Izaque, lanterna verde), mostraram as constelações presentes — graças ao LASER do Mathias, atração que nos remeteu à infância Jedi. Todos queriam pegar o laser do Mathias... rsrsrs.
Cerração caiu, barriga cheia, muitas besteiras ditas (e não ditas), hora de dormir e torcer pra onça não pegar ninguém.
Quarto dia – 21/04/25
Às 05:30h amanheceu com uma aurora no céu... fantástico.


Hora de preparar um café, curtir os satélites do Starlink passando, e preparar o último ataque do dia: rumo ao Pico do Papagaio.
Café tomado, barracas desmontadas, bora curtir a Pedra do Altar — vista fantástica para o planeta Terra.
Por volta das 10:00h, chegamos ao Acampamento Base_1 do Papagaio. Alguns integrantes permaneceram, enquanto outros atacaram o pico.
Levamos uns 35 min para subir até o cume do Papagaio. Encontramos alguns pontos escorregadios por causa da chuva do dia anterior. Aos seus 2100m de altitude e com vegetação bem florida, tiramos algumas fotos — mas nossa visão de 360° foi só neblinaaaa... rsrsrs.
Mais uns 30 min e reencontramos os outros integrantes. Parada para um lanche, muita prosa e logo em seguida nos preparamos para descer e finalizar a última etapa da travessia.
Um nativo montanhista da região nos orientou sobre o uso do famoso “Shit tube”. A pauta foi a contaminação nas trilhas por conta do grande volume de montanhistas e o quase nenhum cuidado com a região.
Por volta das 12:00h começamos a descer tudo que subimos nos últimos 4 dias...
Nossa friend Medina volta e meia dizia que não queria que a caminhada acabasse... rsrsrs... mas... rsrsrs.
E graças às papetes da Medina, nosso amigo Jeferson (Claus, Curiri, sabe-se lá quantos nomes...) finalizou a caminhada menos sofrido — muitas bolhas nos pés!!
Às 16:00h já estávamos na estrada, esperando a van. Ao embarcar... bora pra Aiuruoca tomar um cafezinho.

Partimos em direção a BH com a missão de chegar antes da meia-noite pra despachar nosso amigo Igor pra Ipatinga no último busu...
Chegamos a tempo, mas não tinha passagem... Depois ele conta como foi... rsrsrs.
Essa foi mais uma travessia com muitas serras, cachoeiras, chuva, sol, céu fantástico, novas amizades, alguns perrengues... Enfim, tudo que as montanhas nos proporcionam! Uhuuu!
Logística
Acesso ao Início: Van ou carro até a Comunidade da Vargem Grande (25 km de Baependi).
Retorno: Van ou carro de Aiuruoca a BH (com possibilidade de parada para café ou jantar).
Pernoites: Acampamentos selvagens — Salvador, pós-Charco e Retiro dos Pedros.
Água: Abastecimento em riachos e cachoeiras — leve clorin ou filtro.
Banho: Cachoeiras e lenço umedecido (sem água em alguns acampamentos).
Alimentação: Rango compartilhado, permuta de cachaça, panela perdida e reencontrada.
Segurança: Uso de rádio, corrente humana para travessias de rio, atenção a animais silvestres (como onça).
Dicas de Ouro
Leve bastão de caminhada — as subidas são punk.
Proteja bem os pés: meias adequadas, vaselina e papetes salvadoras.
Leve uma panela extra (vai que...).
Cuidado com as picadas: marimbondos atacam mesmo!
Use o “Shit tube” e preserve as trilhas — o papo é sério.
Cerveja não vai, mas a cachaça faz amizade (com moderação).
Não subestime a cerração nem a altitude — monte acampamento cedo.
E principalmente: vá com o coração aberto, porque as montanhas transformam!
Sobre o autor:

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